lunes, diciembre 17, 2012

cecilia meireles. estirpe




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Estirpe

Los mendigos mayores no dicen nada, no hacen nada.
Saben que es inútil y exhaustivo. Se dejan estar. Se dejan estar.
Déjanse estar al sol o a la lluvia, con el mismo aire de entero valor,
lejos del cuerpo que dejan en cualquier lugar.
Entretiénense en extender la vida por el pensamiento.
Si alguien habla, su voz huye como un pájaro que cae.
Y es de tal modo imprevista, innecesaria y sorprendente
que para oírla bien tal vez giman algún ay.
¡Oh, no gemían, no!... Los mendigos mayores son todos estoicos.
Pondrán su miseria junto a los jardines del mundo feliz
pero no quieren que, desde el otro lado, sepan de la extraña suerte
que los recorre como un río un país.
Los mendigos mayores viven fuera de la vida: se excluyeron.
Abren sueños y silencios y desnudos espacios a su alrededor.
Tienen su reino vacío, de altas estrellas que no cobijan.
Su mirar jamás mira y su boca no llama ni ríe.
Y su cuerpo no sufre ni goza. Y su mano no toma ni pide.
Y su corazón es una cosa que, si existiera, súbito olvidaría.
¡Ah!, los mendigos mayores son un pueblo que se va convirtiendo en piedra.
Ese pueblo, que es el mío. 



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Retrato

 No tenía este rostro que tengo
tan calmo, tan triste, tan magro,
ni estos ojos tan vacíos,
ni el labio amargo.
No tenía estas manos sin fuerza,
tan paradas, tan frías, tan muertas.
no tenía este corazón
que ni se muestra.  
Y no entiendo esta mudanza,
tan simple, tan cierta, tan fácil.
¿En qué espejo se perdïó
mi rostro grácil?  


Cecília Meireles, Río de Janeiro, 1901-1964
traductor s/d
imagen de Vlada Mirkovic© – The Keeper of the Silence, en Uno de los nuestros


Estirpe

Os mendigos maiores não dizem mais, nem fazem nada.
Sabem que é inútil e exaustivo. Deixam-se estar. Deixam-se estar.
Deixam-se estar ao sol e à chuva, com o mesmo ar de completa coragem,
longe do corpo que fica em qualquer lugar.
Entretêm-se a estender a vida pelo pensamento.
Se alguém falar, sua voz foge como um pássaro que cai.
E é de tal modo imprevista, desnecessária e surpreendente
que, para a ouvirem bem, talvez gemessem algum ai.
Oh! não gemiam, não... Os mendigos maiores são todos estóicos.
Puseram sua miséria junto aos jardins do mundo feliz
mas não querem que, do outro lado, tenham notícia da estranha sorte
que anda por eles como um rio num país.
Os mendigos maiores vivem fora da vida: fizeram-se excluídos.
Abriram sonos e silencios e espaços nus, em redor de si.
Tem seu reino vazio, de altas estrelas que não cobiçam.
Seu olhar não olha mais, e sua boca não chama nem ri.
E seu corpo não sofre nem goza. E sua mão não toma nem pede.
E seu coração é uma coisa que, se existiu, já esqueceu.
Ah! os mendigos são um povo que se vai convertendo em pedra
Esse povo é que é o meu. 

Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.
Eu não tinha estas mãos sem força,
tao paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.
Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
Em que espelho ficou perdida

a minha face?




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